Profano o espaço. que será. seja. um caminho. vereda de memórias.

domingo, 9 de março de 2008

VINHAS

aquecias as tuas mãos na minha samarra

havia por ali um animal indecente

havia por ali um animal inocente

eu sentia o teu cheiro a léguas

andavas muito nas esperas

não te avistava no jardim ao fundo

o mundo era surdo para mim

passava gente eu via e era cego

as pessoas diziam coisas que eu não entendia

como a mulher da sapataria que exclamava :

_nem o meu foi um amor assim

ia para dentro desinteressada da cliente

eu sabia a mulher passava revista aos sapatos em frente ao espelho

rolando a perna alta e levando os mais baratos

quando passávamos já a cliente se afastava

e ela connosco queria falar do que tinha esquecido

abanando a cabeça dizia: eu nunca vi cliente assim

fez oito mudas de sapatos comeu –me o tempo

o tempo passava nunca parando ela sempre falando

atrás de mim como uma só noite afinal

beijando-me a ira no pescoço com o gume de um punhal


JRM

quinta-feira, 6 de março de 2008

Anatema escreveu....

por questões práticas e imediatas aqui deixo a autoria do poema
abaixo escrito: Anatema

un abrazo de marzo

somos alas sin rumbo
a la deriva.
volamos
planeando
a favor del viento
hasta cruzarnos
en el aire
con la brisa
que provocan
otras aves
que pasan
a nuestro lado
saliéndonos al paso.
en nuestro camiño

marzo de 2008

quarta-feira, 5 de março de 2008

Fundadora do Tempo

A casa, o neno , o tempo e ti

A casa que levei comigo desde a nación primeira
e desde sempre souben levantada nas beiras dun espello azul


O neno , auga dun beixo , soberano amor que docemente obriga .

O tempo , estas janelas
abertas a outros sen razón .

E ti

raíz da vida nova ,
fundadora do tempo
Beatriz.

In , a escrita das Aves de Marzo, de Xosé María Álvarez Cáccamo, Ed Tema 1997





terça-feira, 4 de março de 2008

Maria Gabriela LLansol

.... em A., tão estável, pressinto uma mutação: ele entrega-se a um certo sofrimento, abre-se. O que é o abandono, e ponto de passagem. Confirma-se que um pouco de nenhuma coisa nos é revelado. Passeio com Jade damos sempre o mesmo passeio e esta cidade, quase um burgo, parece o meu lugar natural de nascimento. Onde vamos todos ? À noite, queimo ervas odoríferas e eucalipto, o meu texto tem sido um pouco abandonado, e o de Augusto também.
TEXTUAL é PRUNUS TRILOBA que florirá. Escuto muitas vezes esse arbusto , que se mantém direito a meio da fachada da casa. É Outono, o meu primeiro Outono numa casa minha que tenha um jardim. A ramaria , ainda jovem, de PRUNUS TRILOBA, espalha conceitos sobre o ar, conforme penso. Spinoza enunciou que as palavras só tem significação precisa em virtude do uso habitual que fazemos delas. Quando terá Prunus Triloba a força suficiente para se tornar um Uso Habitual?

in finita .... Maria Gabriela Llansol (2008)

sábado, 1 de março de 2008

ontem ....

falo contigo, e no entanto, foi ontem que guardei a chuva no cabelo
o meu riso soube-o primeiro, os meus lábios depois, logo a língua inteira
os beijos souberam-se na boca procurados, indecisos e talhados
porque assim eram os beijos fundos da raiz

foi ontem, eram os prados aquecidos pelas flores brancas
que gostavas de morder nos dedos, olhando de frente o sol
mordias, mordias os trevos e as palavras com os dedos
eram as tuas mãos despontando para as manhãs molhadas

a chuva vinha com o sol, o sol trazia pouco calor
não precisávamos nós de calor, só precisávamos da chuva no cabelo
e de a dizermos de corpo unido o que descobríamos do amor


Canção

encontrei o anjo
ás portas da cidade
vinha voando, voando
no brilho impuro da luz


encontrei o anjo
às portas da cidade
vinha soprado, olhando
o linho vibrante da lua


encontrei o anjo
às portas do metro
vinha de verde voando
por uma escada só sua

encontrei o anjo
às portas do jardim
vinha dançando, rindo
descia das casas a pino


encontrei o anjo
às portas daquela rua
descendo por uma escada
tornando a terra sua
JRM

Ainda Marcin Sendecki.....

O rigor do aleatório



«Marcin Sendecki nasceu em Gdansk , na Polónia , em 1967. Iniciou os estudos em Medicina , mas veio a formar-se e a fazer pós-graduação em Sociologia, na Universidade de Varsóvia. [...]
Os poemas de Marcin Sendecki deixam-nos um sentimento de desolação , um vazio preenchido por coisas grotescas , uma solidão habitada por gestos desencontrados .É por isso que nada parece fazer sentido: o absurdo instala-se, à nossa rebelia, nas cidades , nas nossas casas, nos objectos quotidianos, tornando tudo irreconhecível.
Não são arbitrárias nem gratuitas as palavras que tecem a nudez destes poemas , a que subjaz uma componente fortemente política , às vezes velada , às vezes a descoberto , como em » Desta vez não haverá vítimas ». Na escrita de Sendecki está sempre patente a orientação alienatória das nossas vidas ; os poemas delatam a falta de liberdade , de verdade , os excessos e as omissões e conseguem inquietar -nos através de uma ironia cruel , formalmente lacónica em que se diz apenas o indispensável .....».

Rosa Alice Branco, in Parcelas, tradução colectiva , Poetas em Mateus



Poodle Springs

Não é a minha cidade . fumei
um cigarro, caminho longamente no quarto ,
para me livrar dele .

ouço o cão , vejo
o carro à entrada. falarás
através de uma placa de coisas


úteis. a nossa fotografia na
página do jornal, embora não
haja motivo. sou saudável

como bourbon
e apanho
na soleira da porta um envelope
timbrado.

Se quiseres
ver-me entra e fecha

a porta.












segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Dou-te o meu nome

dou-te o meu nome
como se antes sentido
nele não houvesse
e não havendo tu soubesses
o meu nome

esse som da tua boca
duas sílabas só tu aqueces
essa busca inquieta
esse jogo do chamar
como quem procura mundo
treme supondo --- eu lá não estar

também chamo por ti
só a querer-te me calo
teu nome são duas sílabas abertas
raiando o azul dos prados
oferecendo luz ao mundo

só o teu nome por mim chamado
essas sílabas crescentes
duradouras na minha fala
só na tua boca estão presentes JRM

uma sombra

uma sombra a daquela àrvore distante crispando ao sol no horizonte
os ramos como mãos abertas dedos intermináveis: a paisagem
todo o monte desacertado em ondas de calor

os olhos desferem a golpe rude a mansidão das espadas
colhidas pelos séculos de terra ardendo no sangue
o rigor dos dias de mansidão e do abandono JRM

chegadas

chegava no Inverno
o intenso frio
ardiam as mãos no fogo


chegava no Verão
o intenso calor
ardiam sombras
era verde a escuridão

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

O verso eterno

»ELES PASSARÃO ... EU PASSARINHO»


IN MÁRIO QUINTANA

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Mentira ?

A mentira é uma verdade que
se esqueceu de acontecer


in Mário Quintana obra completa

Pegadas

Transportaram-me e alimentaram-me. Lugar
escolhido ( actividades próprias de escalões inferiores)
Mexeram em mim, depressa. Fui inteiramente eu próprio
Perderam -me


in , parcelas, Marci Sendecki

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

A vida conjunta

À porta dos cemitérios cobram elas.

As carrinhas beges de porta corrida estão sempre abertas, dentro cravos, rosas brancas, vermelhas, malmequeres, flor do linho, verduras de emplastro, lentisco, magnólias , fita de laços e, sobretudo, os cravos vermelhos luzem na sombra dos tectos gradeados, molhadas hastes na água, o pé no plástico preto, desprende a haste.

É Primavera ,e se não fosse pouco mudaria, talvez um panamá, um plástico de atilho com estrelas brancas, um chapéu de chuva azulão bem aberto que cobrisse cliente e vendedor, abrigasse negócio, a palavra regateada, o dinheiro trocado, a flor mal escolhida, o desagrado da cliente, logo uma mudança rápida por outra que condissesse mais com a dor ou com a libertação do peso ou acidente duradouro.

Uma anedota depois por detrás das costas, um gracejo, um esgar... O negócio tinha sido lacrado.

Quase ninguém vem, elas sabem que o negócio não vai fartar, dão-se às linhas, às rendas infinitas que se avolumam nos sacos de supermercado e dia-a-dia pesam , dão-nas a jovens mais desfiguradas pela droga ou a lares, são o testemunho das esperas contadas pelas mortes vindas, pelo sentimento de perda mal chorado num espaço, onde só o coveiro assobia como um pássaro que pousou no cipreste e teima em ficar aquela noite sem que haja provavelmente outro pouso, outra luz, ou uma semi - escuridão lunar...

As prendas ficam sempre na carrinha persistem em não as levar portas adentro de casa .

Ouvem muita música, sonham muito, orientam-se pelos telemóveis, é só picar números, descer sons musicais ou ruídos, marcam encontros e comparecem, vão pela gula dos sentidos, orientam a casa, como senhoras lembram a comida nos taparués no congelador às mulheres a dias, têm filhas mestres, doutoras, e filhos engenheiros, empregados de balcão do turismo , chefes de informática, e emprego municipal .

Estão ali, não suportariam estar em casa como as mães, nunca votam dá -lhes calafrios e a bota está sempre pronta com a perdigota.

O coveiro abre a cova a golpe de enxada e mais golpe, encontra osso e grita às mulheres que bom é não estar morto.... elas acodem com riso, levantam-se das cadeiras de lona ou dos assentos das carrinhas e unem-se, deixam de lado por momentos os acordos dos negócios ou a peste de uma outra de lado, esquecem-se das traições das escolhas dos clientes ditadas flor a flor e vêm rir às portas do cemitério. Pedem lume, umas às outras, exibindo algumas delas os cigarros caros nos sobrebolsos dos aventais... E o coveiro grita de novo e só afugenta o réptil que passeia na laje ou as abelhas que surgidas do nada desabrocham das flores viçosas e zoam abertas pelos ares.


O ar é fresco , o céu é limpo, há luzes eléctricas a florescer no brilho das pedras das sepulturas e os melros param a ensaiar um canto, uma busca de uma rota de asas , um caminho de saltito em saltito, por dentro dos talhões, das áleas , dos santos das moradas , dos jazigos .

Os jazigos estão fechados. Uma mulher cigana está sentada cá fora e tem enormes fotografias de uma filha bonita, morta numa ronda de droga, diz a quem passa, comprei tudo isto a uma família que cá já não tem nada de seu, só uma placa que dá para o talho, um médico. Não abandona a ladainha, chora a sua própria morte.

O coveiro grita de novo, são abandonadas as rendas do ensimesmamento nos assentos e as flores no escuro procuram brilho para morrer, agora só algumas delas com a música bem alta do amor sórdido e sucateiro... .

Há sempre uma comparsa num dia que combina o preço e não o desfaz , partilha o mesmo sonho do amante que lhe deu pancada e fez juras que elas nem escutaram, mas vivem da distância de uma conversa, de um carinho todo feito de cama, combinado, assim mesmo ao telemóvel que trazem nos seios altos rasgados no triângulo dos vestidos .

Estas combinam a partir daí a vida doméstica, a sopa, os horários dos ateliês dos filhos e das velhas que os vão buscar para almejar um beijo, a possibilidade de fazer uma festa no cabelo, recomendar o rogar a deus ... elas também como as outras indicam os taparués no frigorífico, dão ordens à mulher a dias , são verdadeiras tiranas, como se fossem rainhas libertas do vinco das calças do marido, das camisas. Os filhos andam de qualquer jeito, foram cuidados quanto baste, falta-lhes a elas em geral a última disputa, a escolha da namorada certa, porque até aí já que os pais não se ajeitam,dão-lhes elas os primeiros preservativos e o conselho de que a morte é certa ,como um e um somarem dois ou três , e não há dinheiro para abortos decentes.

As flores dos mortos andam dentro deste movimento, assentam valor neste contrato, na venda de cada flor que dá o magro pão, o perfume ao amante a que foi dado a cheirar no papelinho da grande superfície, a camisa nova dada ao marido, uma surpresa desvalorizada, num instante.

Aos sábados vestem–se como rainhas de novelas, e delas são encantadas por músicas do principio ao fim , roem as unhas do verniz de domingo, regulam o colesterol dos maridos, contam os cigarros, sentam-se nos sofás gostam do futebol deles e compreendem também as jogadas.

Nada se desperdiça, condoem-se com a dor alheia, proclamam que é sempre melhor assim, agora uma viagem, uns dias folgados, uma praia, um passeio na mata, umas missas, e umas mãos mais abertas no descanso das manhãs e nas noites passadas sempre de alerta : vai ver que vai rejuvenescer.

Quando aparece alguma com o luxo do preto e do ouro, já cheia de flores, assobiam como o coveiro , riem-se dela como se um amante não andasse perto e não o escondesse por onde elas se festejam à noite, dando luz ao corpo nos bailes em grandes nos salões .

O ruído clássico do telemóvel, conversas criptadas que só algumas conhecem. Não é cumplicidade é devassa

A velha que vem limpar algumas campas traz unhas pintadas, mas não como as delas, invejam-na, comparam–se mãos pedem que lhe as mostre antes de deixar os baldes pretos, os esfregões , as lixívias e os sabões das campas num canto, até ao dia seguinte. Dão-lhe às vezes boleia , outras deixam-na partir no último autocarro diário, e a velha parte com conversa picante com o condutor que ouve jazz e usa rabo de cavalo, um empenho da namorada que o penteia em público nas esplanadas.

Na vila tudo se sabe, e a rapariga sabe bem disso, aprendeu. Está ali junto do condutor ainda cheira a detergentes, tira um anedotário velho das algibeiras serve-o às colheradas ao rapaz, ri-se sem qualquer jeito, a ele provavelmente aquilo nada lhe diz, ela insiste, o autocarro segue pela estrada, despede-se dizendo à saída: diga às putas como são os coirões.

O autocarro continua, o rapaz nem ouviu tudo, e a velha parte com a convicção de que conhece este mundo e a lua ... .

JRM

À minha filha

a fonte não mata corre água
morre a prata
chove água no nariz

a boca atravessada no riso
só molhada a face

engole:
- vês o esforço
- fiz

agora vamos correr
há erva e mato
há pinhas secas
há grito aflito

eu apanho-te

(tantas letras trazes
no chapéu
só vejo pássaros
a fugir dele )

disfarças
eu ganhei
eu perdi
eu toquei

(vi no mato
violoncelos a
tocar os teus
cabelos !)

fui feliz
por vê-los
sou assim

ri meu coração
ri sôfrego
à exaustão da luz
mais corrida sim
vamos

(onde
estou perdido filha)

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Fragmentos


a luz, o cinzento
uma pedra

leva


o medo, o verde

uma estrela cadente
acende


o susto, levita
arranha eleva
gravita
é teu
é meu

a fronte, arde
é um sinal
finito da
luz
é
cedo

é o medo o fim
de ti e de mim
é a tarde

ouve:

o amor, a cor
vermelha dada

à flor do trevo
na enseada


o mar,

onde
lavaste
as mãos

tiraste anéis
desataste

a pulseira nua
dos cordéis
andaste


o céu, ganhei
a lua
a mais
boca
a tua


JRM

Sopros e andamentos






escreve as coisas imprecisas
um risco no mármore
a pomba podre
na janela

o que não arde



vê no risco da parede
o trajecto da viagem
o tráfego
o nobre edifício

o átomo circular


escreve o impreciso
à passagem lapidar:
um jornal tido
abandonado na laje
o vício popular
o lixo





mulher de olhos vendados
está com as mãos ocupadas

no cordel

ata despacha assina
com olhos rasurados
luz no pulso ouropel



as mãos de menina
já velhas encolhem-se puxadas
vão e vêm



resume inclina-se
detém-se continua
pensa agrafa
estica rende
convém


estima declina
o tempo são estátuas
o mundo é muito longe
a casa presume

o verbo habitar o fumo



adeja volátil abelha
recolhe
fósforo
não incendeia
descansa
tudo profissional

deseja


passa ouvido ao telefone
a ida sozinha
aos buracos no exílio
uma aldeia próxima
crê em tudo
sempre alheia


vinda confessa-se do mundo às amigas
é hora é almoço
distrai-se e
é distraída

JRM












terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Que vêem




e quem vem, quem parte, vai e volta com a gula dos oráculos, espinha-se em adivinhações mantendo viva a insinuação, diz que entende até dos ventos como os velhos saibéus, gosta de lírios, atende à mingua a velha saudade de barcos, e espreita o alheio, como se houvesse rumor de um pombo no telhado e quisesse ver nele ainda outra asa ferida e todas as penas ardidas no seu próprio rosto.

Tal é o desgosto. Amam o ódio deitam-se embrulhado com as aplicações feitas, não pressentem as feras, estão de outro lado, e não sabem .... Acordam com uma caixinha chinesa no umbigo, procedem às rotinas do amanhecer com o ódio ainda nascente que mal sabe adormecer . Os velhos saibeus também chamavam a este ardor de adivinhação um mal viver consigo e só nos pratos balançados de suas mulheres acreditavam ser e querer, desejar e andar, mas com toda a certeza de outro lado. Não o meu ... Não podem, mas espicaçam veneno e a uma anedota de palavras chamam cumplicidade.

São espectros cinzentos e partem em debandada, sentam-se nos bancos das empresas, escritórios, nas instituições como se fossem reis, calculando no deve e haver guardar o gado... Engolem duas linhas de trabalho e vergam-se de hierarquia em hierarquia, tudo lhes serve, tudo lhes cabe. E, no entanto, a espinha que é o dorso, move-se atónita como o espaço, apreciam o ferro e o aço da melancolia, quando a pequena existência lhes quebra o passo. Olham, desdenham, mas inibem-se quando uma abelha tresmelhada, lhes cai certa no olhar e estão acompanhados, e a pergunta é sempre por que fui eu, se há mais alguém, e está presente ou se afasta para outro lado, ser seu igual ainda se tornaria pior. Vê-se só a espernear por todo o lado.
Vejo-os na vida nova armazenando fel, e dele se abastecem diariamente com a fartura dos contentes de coisa nenhuma, vivem o ordinário commumente, no sentido que damos às coisas mesquinhas que lhes são o seu empreedimento. Enfeitam-se de suposta cumplicidade, mas tudo lhes é moribundo, e nem habitualmente ousam o que certos animais fazem, não se escondem para morrer do dono... Não gostam da surpresa de nada, como se tudo se lhes fosse dirigido, coçam no umbigo como se aí houvesse uma caixinha de música chinesa. Já o disse com a tranquilidade do devir, sem presumir inocência. JRM

sábado, 26 de janeiro de 2008

Canção




ainda te é noite
ainda dormes fugindo
à espera da minha mão
os teus olhos vão abrindo


abro-te as janelas
luzes ainda deitada
acende-te o sol nelas
o que se move não passa

o corpo intenso perdura
o corpo tu certo une
o corpo aberto dura
o corpo tempo augura JRM

Excerto da 7ª carta


» Ontem! A queixa dos teus ouvidos... tinhas vindo ao palratório porque só ouvias o uivo dos cães em uníssono ao longe, passos certos de alguém que desafiava na ruela , e o relincho dos cavalos , presos à rédea do pulso das mãos do meu tenente. Morria de sono, não dizia , mas eu conhecia este estratagema quando abandonava a cumeada. Impuseste a tua vontade, embora já não fosse essa a tua condição ; querias ouvir o labor mesquinho daquele sábado, apesar de tudo era quente , aquele Outono, sentias pela frincha do gradeada, a grilheta do sol a medir-se na tua testa, quase não falavas. Vinham trazer-te saudações , confessar-te saudades, e entregar-te oferendas escondidas, coelhos mortos a sacão no pescoço, galinha depenada e quente , eram cristãos velhos que sabiam da tua condição e vinham de longe para te sentir a mão gradeada, ouvir-te a respiração. Depressa te souberam morta de dor de ouvidos , correu a nova pelas aldeias, precisavam de mãe de leite que te pingasse gotas que se contassem em número certo para ouvido interno , não era importante a condição, afirmara D. Brites.
Veio uma mulher morena correndo léguas, querendo acudir-te. Deixou para trás muitas Casas, e pingou-te na presença das demais noviças, murmurando sem rosário um caudal de palavras obscuras . Falou da nóz da tua orelha num descuido, achou-a perfeita de linhas e contornos e abalou pelas traseiras, quase fugida. Dizes-me isso porque queres o meu compadecimento , e suprir assim, deste modo a saudade , a minha falta .
Contam-te a cidade liberta, mas ainda mal te corre no mapa do teu sangue.»

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Dádivas




dou-te o sol de Lisboa
dou-te a língua pura

dou-te a rua
a luz, o endereço

dou-te a frase solta:
e chamo à palavra escuro
muro ,
onde
estremeço

dou-te a linha solta
com a palavra sol

são nossas
estrelas vermelhas
nascidas de sangue branco
onde
festejado o fogo
se comeram os dentes

como as feras
dão aos ventos
uivos e som novo
no céu profano

como humanos
descendentes
JRM




quinta-feira, 24 de janeiro de 2008



um momento branco raiado de tempestades. calmas. atenuantes. gestos e dedos que só eu detenho na sombra animada das tardes de inverno. brandas.


para que tudo na tua face faça sentido.


para.

erguer de novo a pele.

para.

ser a moldura.

ser.

para.

_____________

dou-me à minha língua para não morrer. este era o último verso. verso de um poema do avesso . que insisto em escrever . no reverso em que me atravesso.
JRM

domingo, 20 de janeiro de 2008

CANÇÃO (1)



tu és finita
tens cabelos de ouro
mãos no coração
és finita


tu és finita
como um dia de calor
és finita como a dor


finita finita
como um fruto branco
nos auspícios da sua cor

és finita como uma pérola de oceano
procurada funda
habitas o meu mundo
e honras o meu calor

in Celebração dos dias
JRM


sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Paradigma infinito




A que distância


deixaste


o guindaste ?


in, Tolentino de Mendonça


Oração de jejuar de Maria Ana



bendita a noite de há dois dias bendita a espera da minha língua o dorso o ápice e a mole bendito apertão no jorro repulso amparado lambido na gula da minha mão
bendito o meu soluço a minha língua na passagem das tuas veias e na corola benditos e repentinos os meus dentes incisivos a garra da minha inocência quando te chamava menino por pura gentileza não me arrependo bendito o que te fiz por mim e por ti bendito aqui me rendo aqui aos pés do senhor rezo confesso deus também deseja e a tudo isto não é avesso bendito teu véu palatino úvula suprema recuada ressonância magnética ouvida funda amada bendito doce que muitas fazem e trazem de louvores de D. Brites alvoraçada



rezo-te aos pés murmurando orações tremem-me os joelhos descuido estudos e sermões



digo-te além



morro à tua espera

LÍRICA (2)

Zela por Maria Cristina

defende, analisa a menina

à míngua da flauta dos pastores!

Cobre com lençóis e cobertores,

estima e aquece a flausina ,

primeiro corre cortinados,

depois cobre os cobertores

defende Maria Cristina!


Campo Grande

Laranjeiras

Olha Adília

Os carneiros !

São porreiros são de obras,

andam à gula à semana

ao contado ou à mama

ao domingo são senhores!


laboram no desespero

o cascalho , o drama

as cruzes nos braços

à gula da tua mama.

das tuas irmãs batatas

comem a carne os sacanas

da pinta da Maria Cristina

da corrida das tuas baratas

do cheiro da tua carne

do jus ao teu arroz !

terça-feira, 15 de janeiro de 2008


foste. e contigo levaste o rumo do azul cobalto.em barcos vazios. em marés esfoladas nos joelhos do vento. foste para o lugar de onde ninguém volta. nem a revolta.
aguardo agora as tuas cartas. que guardo como rosas. no meu corpo. à guarda do mar.
____________________
(imf)

sábado, 12 de janeiro de 2008

LÍRICA

Sete Rios

Entrecampos

Olha Adília

O Campo das Cebolas!



As palmeiras carecas

Os cravos-da-índia

Os lírios roxos esparsos

Serão flores da tua estima

no roupão do Senhor dos Passos

no reboliço das rimas



Os anjinhos de cuecas

no teu bazar de bonecas

nuas ou vestidinhas

são lírios e profecias

borboletas e azias


Sete Rios

Entrecampos

Olha Adília

O Mar da Palha!



O cheiro de tua rima

é precioso e é novo

gosto dessa comida

e do poema do ovo.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Matança

as patas atadas a nó firme o cordel em cruz

o sol a pino árvore pingando sangue na cal da parede

à sombra mansa do pinheiro a lã vermelha luz

o homem cospe depois bebe vinho mata a sede

verga-se à faca afia-a em pedra lisa cinzenta

olhando uma estrela branca na cabeça do carneiro

o sangue de rompante é a degola do primeiro

a faca a prumo na garganta a pele soprada

a faca esquartejando o sangue no terreiro

a carne viva o suspender na trave cruzada

cobrindo de vermelho um véu de espuma

ainda o carneiro os olhos como bolas

retirados a desvio de faca rente com o riso complacente

de quem tudo esventrou por dentro

os olhos agradados das crianças

escondidas ou afastadas da matança

pedindo por esmolas ou jurando sempre jejuar

espreitando e recolhendo as raparigas as tranças

os rapazes olhando cobrindo os olhos do calor

cumpri um dever no meu cadáver - disse o homem

obscuro impenetrável atirando os braços ao ar

como se estar vivo fosse nascer para matar

e ver os outros desfrutar no palreio no conversar

e rindo vendo as crianças já ao longe a dançar

ou fazendo cada uma delas a sua cova de balde e pá

e os cães deitados no chão atendessem ao chamamento

e se afastassem correndo ao portal

para que o ar bulisse de momento

OUTRA CARTA (?)

Digo-te hoje o que os séculos calaram fundo, o tradicional mito da mulher abandonada, apaixonada pelo aliado, o nobre que te combatia o corpo, o forçado chamado ao silêncio de uma hierarquia poderosa e nula, embrulhada em galões de outros palcos, outras guerras. Como tudo se te ofereceu fácil, da iluminura ao traço rápido do teu rosto, sabes que te deram rosto árabe, moreno, envolta em véu negro, gratidão de andorinha de barcos perdidos de conquistas, homens de braços como forcas, vencedores, procuraram-te em iluminuras desejaram-te percursos, desenharam-te a genealogia. Os mais brilhantes, poetas e pintores, o que fizeram de ti? Não posso calar esse escândalo, não me interessa essa história que se desenrolou a contar-te recebida por mim a salto de uma janela, quiseram-te acreditada pela Europa, nessa interdição mesquinha para valia de amigo de guerra e silêncio de inimigo. Eu teria um fogo lá fora, quereria fortuna, fama, tinha-te salvo da fogueira, tinha-te acolhido nos meus braços, como se os teus não existissem.

Como poderia ser assim, se os teus pedidos, as tuas orações de salvação, as devoções do corpo ileso tinham sangue novo à superfície, um fogo velado pelo hábito que a função teimava apagar, percebia-a o bem no rogo das tuas mãos privadas de tacto com as sarditas insinuadas na pele fresca que teimava em não morrer.

Não esqueço, vieram cortar-te o cabelo ruivo que persistia em insinuar-se nas longas preces disseste-me, quase desenganada de outra solução. D.Brites impôs o corte a todas no convento, para só a ti te contemplar e só duas cartas minhas lhe mordiam os seios quentes com as marcas da tinta que lhe via nos dedos, quando me vinha buscar, soberba e altiva com o espartilho desfeito, alta ia a madrugada, o calor da noite não justificava aquelas manchas que ela deixava nas minhas mãos no cumprimento ofuscado da candeia.

As noites eram tugidas de silêncio, de medo e de oração afirmava no desejo mordente de me tocar, sabendo que te pertencia, era esse um sinal que desejava que te entregasse. Encontrei-te descontente com o corte do cabelo que fora enterrado por uma rapariguita rápida que viera de Fontinha, com o soldado português de resguardo a desejá-la caída nas estevas do caminho e sobre ela se festejar como animal atento à oportunidade. Vi-o mais tarde e soube-o em conversa indesejada com o meu tenente que insistia em sobreferrar o seu cavalo. A rapariga não sabia como se lhe contavam os anos e refugiara-se num silêncio trémulo desassossegado de pernas e mãos, quando me aproximei e lhe perguntei os anos para ver se coincidiam com a minha entrada para o inferno que tem sido a minha vida por te encontrar. Lembraste-me que a moça vira o cabelo e gritara, nunca tinha visto aquela cor de barro - disse a custo, embora soubesse que a fala lhe era interdita. Tivera tanto medo que os pentes mal lhe corriam de festas e a tesoura desfazia-se deles, como das crinas de um cavalo. Levou a tarefa a cabo sob ordens confessas, e só tu choraste, não tanto por vê-los enterrados à parte das demais noviças, mas por não poderes desfrutar das minhas mãos que deixava sempre neles um selo de eternidade, sentido nas horas de orações e nas outras horas mais prosaicas da vida.

D. Brites entendera e viera ao teu encontro serena e vingativa para te levar à cozinha, onde a mocita, que mal sabia dizer o seu nome, se refastelava com um bocado de pão serraceno que era costume oferecer-se como esmola a bandidos e pedintes que o rogavam a troco de orações pensadas enquanto engolido, repetidas enquanto aconchegado com água que não era farta no convento. Toda a madrugada te lamentaste num sussurro convulsivo com as minhas mãos apertadas na tua cabeça crispadas na tua nuca, pedindo-me salvação à carne, à febre. Um enterro de prazer, diriam os românticos. Ouvia D.Brites escutando à porta dos teus aposentos no convento, como sempre. Quis dizer-te ao ouvido o som daqueles passos, perguntar-te pelas minhas missivas, mas tu entregue à surpresa desgarrada do meu aparecimento mordias a minha boca, desfazias as minhas palavras, quando os lábios se entreabriam eram sempre para me lembrar o meu desaparecimento, a tua cegueira, o meu desprezo, a minha soberba ... tudo isso te alimentava as horas e de tudo isso te alimentavas. Nunca te pude contar que tantas cartas te enviei e nunca consenti ao meu tenente que o fizesse nem ele se atreveria, embora na obrigação da ronda sob o uivo dos cães, te levasse a fúria da minha febre que no acampamento sobressaltava os homens que davam a guerra por ganha, viam-se mortos nos que tinham matado e vigiavam–me de acordo com funções e cumprindo ordenações ditadas muito antes; alguns deles vingavam-se no abandono e esperavam morrer no dia seguinte ou fugiam. A minha paixão por ti não era um comum raio de tempestade a que nós nos fomos habituando, era uma chuva torrencial que lavava o meu corpo do fogo inglório de te querer e não te ter por perto. Maria Ana, gritava em pleno acampamento, o eco contra os montes já os camponeses aravam terras protegidas e os mais cautos dos soldados convenciam outros a fazê-lo. Deixo-te com esta lembrança, mas voltarei não para fazer do tempo um suspiro, mas cavá-lo com as minhas palavras e a redundância delas e relembrar-te episódios que o tempo cobriu de anjos, não nos azulejos, mas na inscrição das rosas que fazes tuas, e perante elas eu só amachuco duas, e essas duas são sempre minhas. Chamilly

Uma carta a Maria Ana


Nunca consideraste durante muito tempo que o meu amor por ti fosse verdadeiro, exasperavas só porque o meu tenente ia buscar as tuas cartas, como se não levasse as minhas, essas a que pouco aludes que passavam primeiro pelas mãos de D. Brites, depois pelos seus seios de onde as retirava para as ler às escondidas, presa ao meu desejo acarinhava-te os dias, seguramente passando noites em claro junto à porta dos teus aposentos ouvindo de corpo aberto e vontade indomável de te pertencer. Quase todas as noites te sobressaltavas, levantavas-te imediatamente, como se o meu regimento me viesse procurar, sentia-te o corpo oprimido, as costas tensas embora levantadas, o cabelo louro caído, as coxas trémulas no lençol, os olhos brilhavam sob a luz fosca da candeia, punha-me ao teu lado, os pés firmes na suarda , mas o vento soprado já era só um fôlego sumido no palratório há muito que ninguém assistia ninguém.... Só aquele som muito chão , um canto antiquíssimo arrojado vibrando a corda de muitas vozes em uníssono. No quarto quente, as tuas palavras ainda as lembro.
«Tenho relâmpagos no peito quando vens, tenho relâmpagos no peito quando não vens ou quando prometes vinda nas tuas breves missivas ou sinais, torço a carne em orações , vibro na mais estrita devoção de me cumprir nas tuas mãos de te dar a minha carne à boca de me ver arder na fé pública sabedora do desejo infame, escondido e acossado, contrariando alianças, jogando a glória de territórios no préstimo dos vossos serviços, protegendo, restaurando, salvando-me da minha fogueira , a mais áspera à minha condição».

Sendo madre fiquei soror, sendo Maria Ana , deixar-me-ão nos séculos como Mariana. Também te acorria a glória, também te sentias perseguida pela história, uma e outra cruzando-se numa disputa triste e déspota de um rei-Estado que nem assim se queria.
Ouvíamos os cães lá fora, o vento trazia o uivo até ao nosso recolhimento, tu punhas as mãos na minha boca, eu quase ouvia o sono solto das noviças, pressentia-as à tua porta com candeias à altura do nariz, como quando havia muito vento por entre casas ou briga guerrilhenta nas linhas de fronteiras, e todos ditavam orações nos casebres ao louvor à lua e ao Rei . As noviças, umas atrás das outras, rendiam guarda de ouvido a ouvido à porta de teus aposentos à beira do nosso abismo, sei que algumas delas me queriam com brandura de afago, D. Brites insinuava quase abertamente quando as guardava nos seios, contava-me o meu tenente, eu escondia ou esquecia, mas rendi-me sempre à implosão dos teus olhos, a essa espada mais forte do que todas as armas que me licenciaram para este destacamento involuntário; eu tinha o apreço e aplauso de outras damas o tom solene da conversação, a fala breve que consentia a escuta. No entanto, o fogo morno do interesse, a atracção complacente, quase desinteressada era teatro vão . O interesse era sempre pela mesma pele de guerra surrada a fogo de juramento anunciado. Duvidavas, voavas, desinteressavaste-te, insistias que não sabias nunca notícias minhas , sujeitavas-me à impiedade, abjuravas, apontavas-me desmerecimentos, acusavas-me de falsidade, de penhora de honra, regateavas com o meu tenente idas e vindas rápidas ... Nunca soubeste que D. Brites, impostora, disfarçava, recebia as minhas cartas guardava-as no peito entrouxado de tantas outras, disse-me mais tarde o meu tenente que se punha em arte de fuga acostumada sob suas ordens aflitas, curiosas, e de bençãos latido dos cães.


Eu sabia, ouvia-se ao longe crescia-me nos ouvido, como se houvesse emboscada ou disso dessem sinal, o ataque do inimigo estivesse perto numa faúlha incendiando as searas, matando o gado, roubando rações, comendo pão ázimo sempre a desfrutar das mulheres sob o olhar apiedado das crianças e o diabolismo dos homens que acabavam por matá-las. Se agora te conto isto, foi por que nem somente me crias quando te dizia que passava horas desesperadas por te dar a conhecer este amor desafortunado que implodiu quando subia ao Monte de Mértola para avistar linhas de defesa e de ataque e os teus olhos me seguiam para sempre com a precisão de um raio sob um corpo já adormecido pela lonjura e demora de uma guerra que não escolhi, mas que me trouxe a batalha mais cruel, por não me dares ouvidos quando em desatino de confidência procurava saber de uma carta muito antes de outra tua. Sempre te guardei em segredo quanto mais encontrava o teu halo mais o corpo pedia que resistisse até que eu pudesse partir no sopro do meu cavalo. O meu tenente pernoitava por perto, o meu cavalo relinchava na minha ausência, embora soubesse ao que estava ia e vinha, era preciso acarinhá-lo com festas no barbado quando de madrugada já passava o gado ao longe, pressentia-se o medo dos pastores e as campainhas das ovelhas já não pingavam sinos. Sempre te escrevi, nunca pude deixar de o fazer, embora Sua Majestade, o Rei, a mim, me impusesse as mais restritas obrigações, me louvasse no mais estrito segredo junto dos generais, padecendo a injúria de minha família, o desprezo de familiares afastados, rondando o rendimento também da minha glória. Embora subestimasse, eu mergulhava na glória de tudo alcançar injuriava-me às vezes silenciosamente , vendo os que estavam perto, os que a troco de parco préstimo se queriam elevados a condecorações e já se viam a retornar a novos ou outros campos, onde a glória os viessem festejar com acometimentos vis as velhas populações vivendo com o nariz e os olhos nas terras que mal davam para saldar obrigações. Eu estava certo e mal podia falar-te das minhas inquietações, era o meu tenente que te levava as cartas, embora houvesse algum entendimento mútuo era mal olhado, desconsiderado, havia sempre sempre outros que me deviam obrigações. Não podia alardear muito por considerar impróprio e por saber que as cartas te chegavam lidas ou não, dadas as tuas queixas sem fim, entre o certo e presumido desgosto em que te consumias. Sim, os teus olhos verdes mergulharam fundo e guerrearam com os meus sentidos mal te vi de rápida passagem à janela entregue a contas e demais despachos que obrigavam o convento a formigações silenciosas de raras saídas e muito menos entradas, avistando os montes de Mértola, eu te coroei ao longe quis –te minha , liberta do hábito e das funções que abjuravas e que desde então te entregavam para ser verificado até que ponto cumpririas com pena, obrigação e desejo o que de divino te viesse de carne, osso e pele enterrar-se no teu corpo. Ainda te contarei mais , outras cartas não recebeste, outras coisas são te de ti ditas e nunca por mim escritas . Chamilly
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não. não me digas. não me escrevas. não me des.silencies. rasgado o véu sou outra debaixo da pele. ardida e ardente na cadência do milagre que não é de espigas. antes de divinas rosas de sangue que o sangue arrasta no meu ventre. não me abras o vale. deixa-me ser o fogo. mas aquele que arde ao lado das ancas. lá fora o vento é um punho. cerrado. o mesmo que mordo na penumbra do gesto que me ensinaste. não. mas não me esqueças. faz de mim o teu relâmpago.
___________________._________________________ANA.

Profano o espaço.



que será.



seja.
um caminho. vereda de memórias.